Penso que a
ideia de doenças psicossomáticas é para ser examinada e usada com cautela, pois
é um termo usado em diferentes contextos, como o médico, o psicológico e também
o do dia a dia das pessoas, já que é muito comum atualmente ouvirmos dizer que
“essa dor é emocional”. Pode parecer simples supor que uma dor seja emocional,
mas no estudo da psicossomática existem muitas perguntas e muitos caminhos para
as respostas.
Por um lado,
é fácil perceber que as doenças geram emoções.
A preocupação com a saúde geralmente provoca ansiedade, doenças graves
podem gerar muita angústia e até mesmo culpa. Mas e as emoções, elas podem
causar doenças? A expressão de emoçôes em sinais físicos ou doenças é comumente
chamada de psicossomática. Mas explicar tudo por esse caminho pode ser
arriscado e simplista.
Pode ser
irresistível relacionar, por exemplo, raiva com dores de estômago, preocupação
com dores de cabeça, estresse com alergias. Mas precisamos lembrar que há uma
integração tão plena entre corpo físico e o psíquico, formando o indivíduo, que
pode ser muito reducionista buscar uma relação direta de causas entre emoções e
doenças, ainda mais considerando que cada um de nós somos únicos e reagimos de
forma diferente tanto em relação aos sintomas
físicos como aos emocionais.
Penso que o
que mais influencia nessa troca entre as emoções e a saúde é o próprio
indivíduo e o seu momento – ou seja, a pessoa com seu corpo físico e emocional
e as suas condições de existência. Nessas condições de existência entrariam
principalmente os seus relacionamentos familiares, sociais e de trabalho.
A psicologia,
tão ampla em teorias e técnicas, também vê a psicossomática de formas
diferentes, não necessariamente excludentes.
De um modo bem simples, há quem procure fazer uma relação direta entre
determinada emoção e um sintoma físico específico, há a busca por uma
simbologia para uma doença – assim, a doença seria a representação de conflitos
e desejos. Também há também a explicação pela ação pulsional (libidinal) no
corpo.
Nessa idéia
da ação pulsional no corpo, seria a intensidade das emoções (de prazer ou
desprazer) que gerariam um excesso pulsional (de libido – ou pulsão de vida –
ou uma ligação entre pulsões de vida e de agressividade) que estaria livre e
precisaria ser extravasado de alguma forma. Uma das formas dessa energia
transbordar seria a ação direta no corpo (provavelmente no órgão mais
vulnerável do indivíduo, naquele momento). Podemos também chamar a pulsão de
energia.
Quando
falamos que o excesso de prazer ou desprazer pode gerar um excesso de energia
que vai transbordar de alguma forma, dizemos que não só a dor, mas também a
felicidade, podem influenciar na saúde das pessoas.
Nem sempre
essa energia irá ter ação direta no corpo, ela também pode – e geralmente o
faz, buscar outros caminhos. Ela pode buscar suporte em representações mentais
do sujeito e ganhar o contorno dos medos, das idéias obsessivas, das histerias.
Uma ideia
importante na psicossomática, quando buscamos uma explicação pelas pulsões, é a
de que o homem, quanto mais consegue se aproximar de suas emoções,
vivenciando-as plenamente, menos precisará lidar com os excessos de energia que
buscam por caminhos e formam sintomas. Ou seja, precisamos aprender tanto
sofrer como nos alegrar.
Além das
emoções e pulsões, não podemos nos esquecer de que temos um corpo físico, com
alguns sintomas muitas vezes inevitáveis.
Portanto, gosto de tomar especial cuidado com o perigo de se atribuir a
qualquer pessoa a responsabilidade por ter determinada doença. Isso é
importante principalmente em relação a doenças mais graves, que geram muito
sofrimento.
Existe uma
diferença muito grande entre o próprio individuo buscar uma explicação para a
sua dor (uma busca legítima e construtiva de superação) e entre ouvir de outro
– um familiar, psicólogo ou médico – dizer que ele fez a sua doença por
determinados motivos. Essa é uma atitude dominadora de quem supõe saber sobre o
outro mais do que realmente poderia saber.
É comum as
pessoas se sentirem culpadas por estarem doentes, é compreensível que busquem
explicações em emoções ou em situações de vida. E é claro que é importante para
cada um construir um significado para a sua condição de estar com uma doença.
É justamente
em momentos de fragilidade, como uma doença física, que as pessoas se veem
desamparadas e buscam suporte emocional, como a psicoterapia, e se sentem
motivadas a fazer um balanço da sua vida, uma análise de suas atitudes. É
quando a vida se torna frágil que a pessoa se faz muitas perguntas, se
questiona como teria sido a vida se suas escolhas tivessem sido outras. O papel do psicólogo, nesse momento, sem
conceitos reducionistas, é o de dar suporte emocional, ajudar a clarificar as
situações, estar com o paciente nessa busca de sentido para a sua dor e de
caminhos para sua existência.